terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Renda-se ao longo prazo

Renda-se ao longo prazo | Valor Econômico

Renda-se ao longo prazo

Maira Vieira/ValorLuiz Severiano Ribeiro, diretor do Itaú Unibanco: "Hoje se você investe R$ 1 milhão em títulos prefixados daqui a cinco anos vira R$ 2 milhões sem risco"

Que tal poder gastar R$ 5 mil por mês, já descontado o imposto de renda, sem se preocupar com a perda do poder de compra de seu patrimônio? Ou ter R$ 1,7 mil mensais líquidos de IR à disposição, com a possibilidade de que esse valor cresça com o tempo? Quer mais? E se dissermos que essa mesma aplicação principal poderia converter-se em uma renda média mensal de R$ 10 mil isenta de IR? Os exemplos ilustram o tamanho atual dos prêmios oferecidos pela renda fixa ou as oportunidades encontradas na renda variável. Os ganhos citados referem-se à uma aplicação de R$ 1 milhão em títulos indexados à inflação, no primeiro caso, em papéis prefixados, no segundo, e ao retorno proporcionado pelo "dividend yield" médio de 66 fundos imobiliários negociados em bolsa.

Hoje há uma rara janela de oportunidades para carteiras com foco em renda ou na acumulação de recursos para o longo prazo, caso do patrimônio previdenciário. O investimento em renda, como o termo sugere, busca ativos que proporcionem distribuição regular de proventos, como ações boas pagadoras de dividendos, fundos imobiliários, títulos de renda fixa com distribuição de cupom de juros ou parcelas de amortizações. Para esse perfil de aplicador, o fator rendimento periódico torna-se tão importante quanto o ganho de capital.

Segundo gestores de patrimônio, consultores e planejadores financeiros consultados pelo Valor, as crises econômica e política, ao mesmo tempo em que causam grandes distorções nos preços dos mercados, abrem possibilidades de ganhos para quem pode manter recursos aplicados por alguns anos.

Papéis atrelados à inflação, como Tesouro IPCA+ com Cupom Semestral (antiga NTN-B), por exemplo, pagam a variação do índice de preços oficial mais uma taxa de juros prefixada que atualmente está acima de 7% ao ano para boa parte dos vencimentos. Uma aplicação de R$ 1 milhão em tais condições possibilitaria obter uma renda semestral de R$ 30 mil, líquida de IR, e, ainda assim, manteria o investimento principal protegido dos aumentos de preços.

Esse mesmo patrimônio, se fosse aplicado em títulos com juros prefixados, como o Tesouro Prefixado com Cupom Semestral (antiga NTN-F), que atualmente tem sido negociado a taxas nominais acima de 15% ao ano em diversos vencimentos, traria um retorno semestral de R$ 60 mil, descontado o IR. Para manter o poder de compra, seria preciso reinvestir o valor referente à inflação em seis meses. Com IPCA estimado em quase 10% neste ano, seria preciso reaplicar R$ 50 mil para compensar a alta de preços no semestre. Ainda assim "sobrariam" R$ 10 mil ou R$ 1,7 mil mensais para serem consumidos. No caso desses papéis, apesar de o rendimento parecer desfavorável em relação aos atrelados à índices de preços, é preciso ressalvar que, caso a inflação caia ao longo do tempo, o prêmio aumenta na mesma proporção.

Os mesmos R$ 1 milhão investidos em uma carteira de fundos imobiliários poderiam proporcionar uma renda mensal, isenta de IR para pessoa física, de cerca de R$ 10 mil, se considerarmos o dividend yield médio mensal de 1,09% em 2015 até outubro, referentes a 66 fundos imobiliários com cotas negociadas em bolsa e ponderados por valor de mercado, segundo cálculo da provedora de informações financeiras Quantum. Neste caso, porém, o montante principal fica sujeito ao risco de mercado, ou seja, a variação das cotas pode ser tanto positiva quanto negativa e, mesmo se houver ganho nominal, a rentabilidade pode ficar abaixo da inflação.

Conforme Luiz Severiano Ribeiro, diretor do private do Itaú Unibanco, as taxas de juros nominais estão tão altas que o patrimônio investido em títulos prefixados dobra a cada cinco anos - se a opção for sem pagamento de cupom semestral. "Hoje se você investe R$ 1 milhão em títulos prefixados daqui a cinco anos vira R$ 2 milhões sem risco nenhum", afirma.

No caso dos títulos atrelados ao IPCA, o prêmio pago atualmente representa quase o dobro em termos de pontos percentuais aos encontrados há três anos. Segundo Ribeiro, o investidor com R$ 10 milhões investidos em papéis indexados à inflação no início de 2012, se quisesse preservar o poder de compra, poderia gastar R$ 20 mil no mês. Esse mesmo indivíduo com esse valor hoje poderia gastar R$ 40 mil, estima o diretor do Itaú.

Essa vantagem, no entanto, faz sentido no longo prazo. No curto, a previsão é de forte volatilidade por conta dos cenários interno e externo. "O mais importante é separar o dinheiro do curto prazo e o dinheiro do longo prazo", afirma Ribeiro.

De acordo com Rudolf Gschliffner, superintendente do private banking do Santander, "estamos vivendo um momento hoje que poderíamos classificar como uma anormalidade, que se reflete nos preços dos ativos". Para o executivo, no longo prazo, é justamente a perspectiva de normalização dos mercados que sugere a janela de oportunidades em diversas classes de ativos.

Na avaliação de Marcelo Cotrim, planejador financeiro certificado pelo Instituto Brasileiro de Certificação de Profissionais Financeiros (IBCPF), um fechamento da curva de juros futuros é quase que uma convicção no médio prazo. "Após passar a fase de turbulências, a gente deve convergir para juros menores", explica. A exposição a esse movimento por meio de títulos mais longos pode ocasionar ganhos após o período de normalização.

Da mesma maneira que os papéis de renda fixa têm oferecido prêmios elevados, a renda variável apresenta oportunidades por meio do desconto nos preços dos ativos. Os fundos imobiliários, uma classe de ativos muito visada pelos investidores rentistas, sofreram forte desvalorização nos últimos anos. "Os preços estão num nível que é difícil imaginar que, no longo prazo, não tenha um ganho de patrimônio nessa entrada", afirma Leonardo Bortoloto, sócio da Aditus Consultoria.

Além do potencial de ganho de capital com valorização das cotas no longo prazo, os fundos imobiliários têm oferecido uma atrativa distribuição de dividendos. Segundo levantamento da Quantum, até outubro o ganho com o dividend yield médio de 66 carteiras do gênero alcançou 9,82%, acima até mesmo do retorno do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI) no período, quando descontado o IR.

Na visão de Carlos Fagundes, da consultoria Integral Trust, "há uma janela para compra de cotas de fundos imobiliários, desde que se olhe para um horizonte de alguns anos". Conforme o consultor, o valor de mercado de grande parte das carteiras negociadas em bolsa atualmente está menor do que o valor de reposição dos imóveis, o que indica um forte desconto. Antes de aportar recursos em portfólios do gênero, porém, "é preciso prestar atenção à qualidade dos ativos em carteira e não apenas na renda que o produto está gerando", ressalta Ernesto Leme diretor comercial da gestora Claritas.

Fernando Monteiro, sócio da gestora de patrimônio Taler, alerta para os riscos desse tipo de produto no curto prazo. A forte correlação dos preços das cotas com as taxas de juros pós-fixadas deve acrescentar volatilidade no curto prazo. "A gente considera que os fundos imobiliários estão descontados em relação ao patrimônio, mas provavelmente teremos reprecificações para baixo no setor [devido à expectativa de elevação da taxa de juros pelo Banco Central em 2016]", diz.

Outros ativos de renda variável com lugar cativo nas carteiras de investidores rentistas, as ações boas pagadoras de dividendos, têm sofrido com o cenário de incertezas. Embora exista certo consenso de que os preços dos papéis estejam descontados, os especialistas divergem em relação ao momento de entrada.

Para Monteiro, da Taler, "não dá para imaginar um mercado de renda variável muito bom nos próximos 12 ou 24 meses". O gestor classifica o investimento em bolsa hoje como "remar contra a maré", ou seja, é necessário um grande esforço para obter um retorno provavelmente menor do que o proporcionado pela renda fixa.

Na avaliação de André Leite, da Tag, o preço dos papéis está muito deprimido, mas não é possível dizer que é hora de entrar na bolsa. "2015 é um ano que o Brasil jogou fora e se 2016 também for assim a bolsa fica difícil de andar", afirma.

Leme, da Claritas, lembra que as ações que pagaram dividendos consistentes nos últimos cinco anos, como Itaúsa, Ambev, Cielo, Vivo e Bradesco, também tiveram valorização no período. "Não necessariamente esses papéis têm um valuation atrativo como pode ser o da Bovespa como um todo", explica.

Segundo Ribeiro, do Itaú Unibanco, empresas com dividend yield atrativos, como Vivo, Comgás, Mahle-Metal Leve e BB Seguridade, embora possam valorizar-se no longo prazo, são ações que vão se beneficiar menos de uma melhora no humor do mercado. "Se o mercado virar, esses papéis sobem pouco, pois são empresas que têm um 'beta' menor [ou seja, oscilam menos que a média do mercado]". Na visão do executivo, quem quer montar uma carteira de renda "ganha mais se fizer isso através de títulos indexados à inflação e de fundos imobiliários".

Se o foco for acumulação de recursos no longo prazo, com objetivo previdenciário, os especialistas chamam a atenção para as oportunidades com títulos Tesouro IPCA+ (antiga NTN-B Principal), que não pagam cupons de juros. Nesses papéis o prêmio e a variação da inflação no período são pagos no resgate. Conforme o planejador financeiro Marcelo Cotrim, o produto que paga o cupom semestral vai ser tributado quando distribui o prêmio e, por conta disso, fica "menos eficiente" em termos de retorno.

Se o foco não for a renda, o investidor pode ainda aproveitar os produtos isentos de IR para pessoa física, como as Letras de Crédito Imobiliário (LCI), Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA). Os papéis, em geral, pagam um percentual do rendimento do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI), referencial de aplicações conservadoras que acompanha a variação da Selic. Com inflação alta, no entanto, o juro real proporcionado pelo CDI torna-se menor, lembra Leite, da Tag. "Nesse cenário de inflação elevada, se o investidor ficar no CDI talvez não tenha o ganho real dos últimos anos."



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